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sexta-feira, 5 de outubro de 2007

Ode a Wander Wildner

Porto Alegre já foi mais importante no cenário cultural brasileiro. Até pouco tempo atrás, o que sobrava ainda se devia ao bairrismo que caracteriza os nascidos aqui, como eu. Hoje, as coisas estão melhores, é verdade, em virtude principalmente de séries de eventos que têm ocorrido em terras “leais e valorosas”. E aqui ainda se escreve - tanto que o joio se mistura ao trigo, permitindo blogs como esse, numa esfregada de pau mole na cara do bom gosto.

O mesmo, todavia, não se pode dizer da música – entenda-se, aqui, rock e afins. Aí, ficamos para trás mesmo! Tudo que se produz na nossa cidade são nostálgicas cópias de um passado belo, mas que não diz mais nada ao presente. Coisas novas, que mudem os ouvidos e as cabeças, estão difíceis de surgir, e os Beatles já estão me dando no saco. Recife, veja só, mais pobre que nós, nos deixou comendo poeira com o mangue beat. São os ócios do nosso provincianismo (mental).

Só que, quando algo daquele passado nostálgico permanece atual, ou se atualiza para permanecer, vira símbolo, e a partir de agora passo a falar de quem, para mim, é um símbolo de Porto Alegre: Wander Wildner, pois quem conhece minimamente a história da formação da juventude pensante do Brasil dos anos 80 e 90 conhece os Replicantes, de que o Wander foi vocalista nos momentos áureos. Os Replicantes, sim, inseridos numa manifestação importante, e ao lado de outros tantos personagens, significaram, de fato, um movimento mental nesse país culturalmente altista. E significaram daqui, de Porto Alegre, e por isso são um símbolo da cidade, e como Wander era seu líder, logo também o é.

Que me desculpem os punk rockers nostálgicos, a quem muito respeito e com quem às vezes até me identifico, mas eu gostaria de tratar da fase sóla do nosso ídolo, porque se ele em si, pura e simplesmente, já simboliza nossa cidade, sua fase sóla representa o pleno gozo de um vagabundo iluminado. Eu poderia estar me referindo ao seu estilo de vida, que até já pude certa vez presenciar, com testemunhas, num bar da Cidade Baixa, que se resume numa lenda que escutei de um amigo de que o Wander não sabe quando é dia ou quando é noite, mas estou falando rasamente da forma e conteúdo de suas canções. Porque quando estou me sentindo um vagabundo iluminado, o que quero é escutar Wander Wildner!

As músicas do Wander são simples em acordes e poemas, talvez ainda sob influência de seu “passado replicante” - e como tudo aquilo que é genial. Pode ser exatamente essa simplicidade que as torna tão profundas, e eu estou falando sério! Mantra das Possibilidades, por exemplo, diz que “Eu queria ser bonito, mas eu não consigo, eu sempre volto atrás”. Ora, prezado leitor, se isso não te diz nada, vá procurar um blog sobre o cotidiano de adolescentes baladeiras que veraneiam em Florianópolis!

Há algo mais vagabundamente iluminado que “Eu sei que eu ando bebendo demais (...) Só quero que você entenda o quanto eu preciso disso”? Porque tudo que um vagabundo iluminado quer é um Lugar do Caralho que tenha “cerveja barata”, sem falar que Bebendo Vinho virou cantiga da torcida do Grêmio.

Sabes quando estás quieto num canto, querendo ficar sozinho com teus pensamentos, em silêncio, e vem alguém te perguntar o que há de errado contigo? Tu sabes que não há nada de errado, que só queres curtir tua melancolia, e podes, então, simplesmente responder “Eu Não Consigo Ser Alegre o Tempo Inteiro”. Simples, né? Mas que define tudo!

Embora minha canção preferida seja O Sol que me Ilumina / Usted, “Eu vou no ritmo da vida, eu vou no ritmo em que a vida me levar (...) Vou me perdendo aonde a estrada me levar”, como um verdadeiro vagabundo iluminado.

Como Wander Wildner.

Um comentário:

Anônimo disse...

Cara, muito bom esse teu texto sobre o ídolo Wander Wildner, o nosso Morrissey mais inteligente e sensível. Concordo em gênero número e degrau com tuas observações. Há braços e confira uma vagabundagem em http://viciodaretina.zpi.net
Hã, fiz uma entrevista com o Wander em 1989 e o filho da puta do cinegrafista sumiu com a fita...putz, poderia estar rolando nesses youtubes da existência virtual...